29 abril, 2009

UMA FOTOGRAFIA CURIOSA E UMA LEGENDA AINDA MAIS


Trata-se de uma fotografia curiosa, esta que já publiquei no meu livro Memórias da Arcada. O seu estado de conservação não é dos melhores, mas nela reconhece-se a antiga sala da Arcada, quando ela era simultaneamente pequeno teatro - lá está, ao fundo, o palco - e sede da Sociedade Filarmónica d'Alemquer, dita a Formiga Branca.
Ela mostra-nos, ainda, uma mesa (bem) posta para uma refeição, que uma legenda impressa em rodapé esclarece ter sido um «...banquete oferecido no Teatro da Arcada por um grupo de republicanos de Alenquer aos oradores de um comício em 21 de Agosto de 1910». O momento histórico aproximava-se.
Mas esta fotografia tem no seu verso uma outra legenda manuscrita, da autoria de João Avellar, que nos chama a atenção para um outro pormenor quase imperceptível:
«...Na cadeira de espaldar (ao fundo) vê-se o barrete frígio (um dos símbolos da República) que Izidoro Guerra ostentava no quadro final de apoteose à República, na revista À procura do Ideal que foi representada nesta vila, no Teatro da Arcada, com geral agrado.».
Aqui fica, pois, este pequenino subsídio para a História do Teatro em Alenquer, uma obra que se torna urgente produzir, uma vez que essa arte teve fortes tradições na nossa vila e concelho, em especial o teatro de revista.
Foram inúmeras as casas onde em Alenquer se fez teatro, por aqui nasceram artistas de renome nacional como Ana Pereira, Adélia Soller e Palmira Bastos, o teatro de rua com as suas Cegadas e Enterros e Julgamentos do Bacalhau também esteve, desde sempre, fortemente enraízado nas tradições das nossas gentes e foram inúmeros os grupos amadores que fizeram subir à cena as mais variadas peças e revistas.
Esta é, sem margem para dúvidas, uma outra história local que merece ser preservada em forma de livro. Enquanto isso não acontece, por aqui vão ficando ligeiros apontantamentos...

24 abril, 2009

EM ABRIL, ESPERANÇAS MIL!


E em Lisboa capital
dos novos mestres de Aviz
o povo de Portugal
deu o poder a quem quis
Ouvi banqueiros fascistas
agiotas do lazer
latifundiários machistas
balofos verbos de encher
e outras coisas em istas
que não cabe dizer aqui
que aos capitães progressistas
o povo deu o poder!
E se esse poder um dia
o quiser roubar alguém
não fica na burguesia
volta à barriga da mãe!
Volta à barriga da terra
que em boa hora o pariu
agora ninguém mais cerra
as portas que Abril abriu!
( Ary dos Santos - "As portas que Abril Abriu" )
Passaram-se trinta e cinco anos...tanto tempo! E no entanto parece que foi ontem... Ia eu meio a dormir, meio acordado no autocarro para Vila Franca, quando me pareceu que alguma coisa de invulgar se passava...Que diabo, não é costume, o rádio vai a tocar e ainda por cima tão alto! Mas espera lá, este que está a cantar é o Fanhais, e esta canção estava proibida!? Foi então que se fez ouvir a voz grave do locutor: «Aqui Posto de Comando do Movimento das Forças Armadas...». Olhei em volta e as pessoas não iam de cabeça baixa e metidas consigo como era costume, antes pelo contrário, todas olhavam em volta trocando olhares cúmplices e exibiam o sorriso mais bonito que alguma vez haviam expressado... Acontecera Abril!
Um companheiro de Abril, o Américo Mosca, disse-me uma vez quando comentávamos que isto estava a andar para trás: «Deixa lá companheiro, eles podem levar tudo, mesmo tudo, mas há uma coisa que com toda a certeza nunca me roubarão e essa coisa é este privilégio imenso de ter vivido um dia tão bonito como o 25 de Abril e uma Revolução que tantos dias de Esperança me deu».
Lembrei-me hoje dele quando estive na Biblioteca da Escola EB de Alenquer para falar do 25 de Abril a duas turmas do 9.º ano, convite que surgiu porque sou deputado municipal com livro publicado. Aceitei, agradeci e acho que já tive o meu 25 de Abril de 2009, pois esse contacto com aqueles jovens e com os seus professores fez-me bem. Caramba! Quem diz mal da Juventude é porque nunca foi jovem!
Mas retomando o fio. Lembrei-me do Américo e às tantas disse que todas as gerações deviam ter o privilégio imenso de viverem um dia tão glorioso como aquele que me foi dado viver, porque sentiriam para sempre, para o resto das suas vidas que num determinado momento a História havia estado consigo, era algo vivido e não contado num manual escolar.
Abril cumpriu-se? De certo modo sim! Todavia ainda há coisas que me preocupam e uma delas é a justiça social. Vejam esta notícia: «Uma advogada, filha da jornalista da RTP "fulana tal", sobrinha de um deputado "excelência tal" e mulher do presidente da empresa pública "tacho tal"...( os "tais" são meus, deixemos lá os nomes...). Há famílias inteiras "repimpadas" e sem dificuldades de emprego, ou seja, o mérito não existe, basta o nascer-se feliz e na família certa.
Depois, porque raio o fosso entre os mais ricos e os mais pobres continua a aumentar? Porque raio a crise não chega aos ordenados milionários dos gestores, ordenados esses já de si escandalosamente altos quando comparados com os dos seus congéneres europeus? Porque raio os Impostos continuam a ser só para alguns? Porque raio não são chamados aos diversos escalões da governação ( das autarquias ao governo ) os mais competentes? Porque raio continuamos a ter um País interior pobre e desprezado e um País litoral rico e chamariz de atenções?
E por aqui podíamos continuar... Porque afinal ainda sobram muitas interrogações...
Mas por hoje deixo-vos com um poema meu, dedicado a quantos continuam a sonhar Abril:
PROMESSAS DE ABRIL, ESSA ÍNDIA POR ALCANÇAR
A viagem é difícil, é certo...
Mas ( mais uma vez! ),
Quem esperava facilidades?
Só não tolero
os ratos exibindo-se no porão,
afiando as garras no cavername,
mijando na água
e roendo o grão da dispensa comum.
Mas são ratos.
Jamais aprenderão a sonhar
e os seus membros desajeitados
nunca erguerão sobre as águas
o poema da glória e do futuro.
Avançaremos!
Por cada nau afundada,
outra emergirá no Tejo
saída desse pinhal imenso
que é o país de Abril que não desiste.
Aqui todos sabem que os Adamastores
fizeram-se para serem vencidos!
Continuaremos!
Para mais há estrelas no céu
balizando a rota,
e o farol da Liberdade não empalideceu
nem esmerece.
Deixai a sereia cantar...
Do convés ninguém arreda!
Venceremos!

07 abril, 2009

A COISA É ANTIGA...MAS TEM REMÉDIO!

A crise financeira mundial tem colocado muita coisa a descoberto, sendo uma delas a forma indecorosa como banqueiros e outros gestores, partem e repartem o bolo que têm entre mãos, ficando, é claro, com a parte"do leão". Os nossos políticos, esses vão olhando para o "bodo" com olhos de quem sabe que os próximos a comerem serão ( quem haveria de ser?) eles próprios.
E sabem o que mais me assusta quanto ao que se passa cá pelo "rectângulo"? É um certo cheiro a «espera-se que isto passe, para que tudo volte ao mesmo», pois não são tomadas medidas que nos levem a acreditar que as regras do jogo mudaram de uma vez por todas, que os verdadeiros culpados vão ter que apertar o cinto para que não sejam sempre os mesmos a fazê-lo ou que a justiça social prometida no já distante "Abril " não seja mais uma palavra vã.
Mas não pensem que a ganância dos administradores e outros que tais é de hoje! Ela tem, efectivamente, fortes raízes no passado. Senão, vejamos este exemplo:
Segundo o Relatório e Contas da Fábrica da Chemina respeitante ao ano de 1942, nesse ano foram pagos de salários, aos mais de cem operários, 68.467$80. Mas o Conselho de Administração, nesse mesmo ano embolsou 198.000$00(!) e o Conselho Fiscal, que reuniu uma vez, 9.600$.
Mas o "fartai vilanagem" não ficou por aqui, pois foram distríbuidos "Dividendos" no valor de 90.000$00. A quem? Bom, tratava-se de uma Sociedade Anónima, com o capital realizado de 1.500.000$00 muito disseminado, mas... só dois accionistas detinham, em partes iguais, 10.810 acções das 15.000 emitidas. Eram eles Manuel Alves Barreto e Manuel Alves Ceppas, sendo que, pelo menos este último era administrador.
Vejam bem meus amigos para quem andaram trabalhando os operários alenquerenses da Chemina, nesse já distante ano de 1942... Para uns senhores que, com toda a probalidade. eles nunca conheceram e estavam lá para cima, para o Porto.
Será que isto alguma vez vai mudar? Diz o Povo que a última a morrer é a Esperança...Espero que não se engane.

01 abril, 2009

OS SAPATOS DO DEFUNTO

Um jovem deputado da CIM-OESTE, eleito pela AM de Torres Vedras, tornou publica a sua intenção de se bater pelo Oeste, o que só lhe fica bem, uma vez que para isso lá está. Mas qual o caminho anunciado? Nada mais que «...uma recomendação ao Governo e às estruturas nacionais dos partidos com assento na Assembleia da República para que promovam a criação do Distrito do Oeste» e a promoção dos mecanismos tendentes à criação de Região-Piloto do Oeste a qual poderá constituir-se antes, em simultâneo, ou posteriormente à criação do Distrito». Esta linha programática foi publicada no jornal digital oestino Tinta Fresca, onde a li. Entretanto a Assembleia da CIM-Oeste já reuniu no passado dia 18 e desconheço se o sr. deputado passou a vias de facto, conforme prometia.
Porque me interesso por estas coisas da regionalização, li e meditei, concluíndo: Aqui está um perfeito disparate... o jovem está, certamente, a contar com os «sapatos do defunto», sendo que, neste caso o defunto é o Distrito, são os Distritos.
Os distritos, essa realidade político-administrativa, surgiram no nosso ordenamento jurídico-administrativo no já distante ano de 1835 com a chamada reforma de Mouzinho da Silveira. Segundo a proposta de 8 de Abril de 1835 «O Reino será dividido em dezassete distritos administrativos. Cada distrito será administrado por um magistrado de nomeação Real, e fiscalizado por uma Junta do Distrito Electiva». Na sessão da Câmara dos Pares que teve lugar no dia 18 de Abril de 1835, o Ministro do Reino justificou o termo identificativo argumentando: «...o não se adoptar...a palavra Províncias ou Comarcas...se se fizessem 17 Províncias, ficariam pequenas, e dizendo Comarcas seria envolver a Lei de eleições...pareceu melhor adoptar a palavra Distrito por ser uma palavra vaga". Assim se baptizou a «criança»...
Os Distritos quando nasceram, eram praticamente aquilo que ainda hoje deles conhecemos, com duas excepções: Lamego e Setúbal. Com o de Lamego mudou-se, pouco depois, a capital para Viseu, tão só porque esta cidade oferecia uma maior centralidade, preocupação que desde o início esteve presente, quando então se tratou de encontrar as sedes distritais. O de Setúbal, esse só seria criado em 1926, pelo Decreto-Lei n.º12.870 de 23 de Dezembro. Até à data do seu nascimento o seu território fez parte do Distrito de Lisboa.
Ao longo dos anos os Distritos foram sofrendo algumas alterações que incidiram, principalmente sobre os seus orgãos e competências. Com a Revolução de Abril de 1974 e o advento de uma nova Constituição, os Distritos foram feridos de morte, mas têm demorado a morrer...Mesmo agora, moribundos e em agonia, não há quem se compadeça e ponha termo a tão infeliz existência.
De facto, quando Abril aconteceu, os Distritos e os seus Governadores, os polícias do regime, não podiam estar pior vistos, pois boa parte da repressão passava por eles. Por isso não admira que hoje ainda se possa ler na nossa Lei Maior, a Constituição da República, que «enquanto as regiões administrativas não estiverem concretamente instituídas, subsistirá a divisão distrital...). Portanto os Distritos não vivem, subsistem... e anda por aí alguém a tentar «roubar-lhes os sapatos» para com eles criar um outro Distrito, o do Oeste. E isto, nem mais, nem menos, agora, quando eles já foram despojados para aí de 90% das suas competências e não beneficiam de qualquer cobertura constitucional! Meus amigos, se isto é política, vou ali e já venho...
Mas há mais: o jovem deputado regional quer uma Região-Piloto do Oeste! Oh meu amigo, se houve coisa que o Referendo, que você ou a sua força política combateram ganhando, ensinou foi que a divisão do território proposta não servia, sendo hoje consensual que a Regionalização, a acontecer, terá que passar por uma divisão idêntica àquela a que obedecem as NUTS II. O resto são invenções, «chiqué» político de mau gosto, tiros de pólvora seca...Dedique-se à pesca que tem por aí uma magnífica costa.