25 março, 2011

CASAS DE ALENQUER

.Fotografia da Colecção Graciano Troni publicada em "Alenquer Desaparecida" de Filipe Soares Rogeiro, Arruda Editora.

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A CASA DA TORRE

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Quem subir a Calçada Francisco Carmo (vulgo Calçadinha), a meio do percurso encontrará a Casa da Torre, uma das mais antigas e interessantes da vila de Alenquer.

O historiador alenquerense Guilherme Henriques, na sua obra A Vila de Alenquer chega a admitir que a sua origem remontará à presença dos romanos neste território, dizendo que «...pode ser que fosse outrora, uma daquelas torres isoladas ou obras avançadas» com que esse povo defendia um ponto nevrálgico das suas posições ou uma passagem dum rio. Sendo certo que o antigo castro na colina sobranceira à vila foi, também ele, castrum romano (e mais tarde reduto fortificado do castelo medieval, aí se situando a sua torre de menagem), é bem possível que esta hipótese quanto às origens da torre, sobre a qual mais tarde se edificaram as casas, tenha alguma consistência.

Outra hipótese avançada é de que esta torre, pela fortaleza e envergadura da muralha «demasiado dispendiosa para ser simplesmente um muro de suporte» talvez fosse, afinal, «o começo de uma nova linha de fortificações, destinada a incluir na praça a fonte que fica próxima, entre a Torre e a igreja de S. Pedro». Quanto à casa, propriamente dita, o mesmo historiador dá a conhecer que «parece que já existia em 1466, e que pertencia, então, ao cavaleiro da Ordem de Cristo, Martim Telles, porque no testamento com que falece, descreveu entre os seus imóveis, na vila de Alenquer a Torre que está junta com o forno do Capitão que é no arrabalde da vila, junto às casas de João Cotrim» e «mais todos os pardieiros que estão atrás da dita Torre contra a igreja de S. Pedro do arrabalde da dita vila».

No último quartel do séc. XVIII nela residiu Félix José Leal Arnaut, pai de D. Maria Máxima Leal da Cunha Arnaut que no oratório dessa mesma casa celebrou casamento com o Dr. Joaquim Pereira Fajardo de Azevedo, bisavô de Moisés Amilcar de Oliveira e Carmo que foi nesta vila técnico da Fábrica do Meio, importante comerciante e um dos fundadores da Sociedade Filarmónica União e Recreio Alenquerense.

Félix José Leal Arnaut que foi «professo da Ordem de Cristo», hábito obtido aos 16 anos de idade quando, então, era para isso exigida a maioridade (um processo interessante que já tivemos oportunidade de consultar na Torre do Tombo), esteve, nesta vila de Alenquer, ligado à existência no sítio da Romeira de uma oficina manufactureira de cutelaria e armas brancas, mas que, segundo nos foi possível apurar pelos livros de manifesto do «Novo Imposto», só teria chegado a fabricar facas de sapateiro.

Era este natural de Lisboa e filho do capitão Francisco Dias Leal, familiar do Santo Ofício e, também ele, professo da Ordem de Cristo. Muito novo andou pelo Brasil e aí teria organizado a sua vida, talvez mesmo, alcançado pequena fortuna, após o que teria regressado definitivamente.

Ainda, segundo Guilherme Henriques, em 1860 residia aí o industrial Lafaurie fundador e proprietário da Fábrica do Meio. De facto este imóvel consta do seu testamento registado em livro próprio (Arquivo Histórico da Cãmara de Alenquer), cabendo por herança a sua filha D. Maria Carolina Augusta Lafaurie que nela também residiu e o teria vendido a «João Marques de Sousa Ramalho irmão do Rev.mº Prior de S. Paulo, em Lisboa, que ainda a possue», isto em 1902.

Durante este período, de 1890 a 1897, nela funcionou a Escola de Desenho Industrial Damião de Goes, uma experiência local de ensino profissional. Mais tarde, pelo anos 40 do séc. XX, foi propriedade do arqueólogo Hipólito Cabaço que também nela residiu, vendendo-a, depois, à Câmara Municipal que aí instalou o Externato Damião de Goes, pelo qual passaram muitos e muitos jovens alunos da minha geração. Funcionou este Externato até meados dos 70, após o que o imóvel recebeu obras que o adaptaram ao funcionamento de alguns serviços camarários.

14 março, 2011

PAPÉIS QUE FALAM

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UMA CARTA COMERCIAL DE UMA ALENQUER QUE JÁ NÃO EXISTE
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Desde a minha juventude que me deixei levar pelos selos, essas pequenas obras de arte que, normalmente, transmitem saber, cultura e beleza. Com o avançar dos anos refinei esse gosto apaixonando-me pela «filatelia temática», aquela que nos permite desenvolver uma tese ou contar uma história através dos selos e de outras peças filatélicas (carimbos, blocos, flâmulas, inteiros postais etc.) e, também, pela «marcofilia» que estuda as marcas postais, no meu caso particular, pelas marcas postais de Alenquer.
Nesse constante peregrinar pelos locais onde será possível descobrir novas peças que enriqueçam as colecções, lá ando também pelos leilões da net, onde, recentemente, descobri a peça que acima reproduzo.
Infelizmente para mim não tem o valor que poderia ter, pois a marca postal (carimbo) que oblitera o selo está esbatida e quase imperceptível, mas como ela me falava da Alenquer de outros tempos, não resisti e desembolsei a fantástica verba de € 3,00(!) para a adquirir.
Esta carta que seguiu de Alenquer para Lisboa onde chegou no dia 14 de Novembro de 1915, conforme carimbo aposto no verso, é uma missiva comercial de uma farmácia que eu, nos meus 63 anos, já não conheci, a «PHARMACIA MODERNA» de «Avellar e Irmão, Sucessor», que se situava na Praça Dr. Miguel Bombarda, hoje Largo do Espírito Santo, naquele prédio em ruínas ligado à Igreja com o mesmo nome, no mesmo local onde depois seria a oficina de funileiro do Sr. Artur que foi comandante dos Bombeiros.
Olhando a carta, verificamos ainda que esta pagou um porte de 2 1/5 C, importância do selo da série «Ceres», n.º 211 do Catálogo Afinsa, em papel porcelana médio, denteado 15x14, violeta escuro, emitido em 1912, o qual no estado usado vale a fortuna de € 1,00(!), mas que em estado novo e sem sinais de charneira (umas peças antigas em papel gomado nas pontas que fixavam o selo ao álbum) está cotado em € 66,00 ( não é o caso...).
Vejam lá bem as preciosidades que se podem encontrar na net...

Nota: A destinatária era proprietária no nosso concelho de uma quinta chamada do Reguengo. O carimbo ficou esbatido porque precisamente no verso, cerrando a carta, estão dois selos da farmácia em lacre. Azar...

10 março, 2011

O DISCURSO DO PRESIDENTE DE ALGUNS PORTUGUESES

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EIS O HOMEM!
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Um discurso de tomada de posse «cruel» como o definiu uma voz do PS? Não! Simplesmente, Cavaco em todo o seu esplendor!
É voz corrente entre os analistas políticos que o cumprimento do segundo mandato torna os Presidentes naquilo que eles verdadeiramente são. Usando uma frase retirada do Novo Testamento (ou de algum Evangelho, não sei), agora que entrámos em período quaresmal, poder-se-à dizer: Ecce Homo, «eis o Homem»! Só que aqui quem levou as vergastadas foram outros que não ele...
Das críticas partidárias feitas ao discurso retivemos duas:«Um discurso partidário», «um discurso que omitiu a crise internacional».
Quanto à primeira, foi de facto um «discurso partidário», partidária e entusiasticamente aplaudido. Isto é mau para o futuro do País, pois aquelas forças políticas que se evidenciaram aplaudindo, mesmo que em futuras eleições (urgentemente necessárias) possam vir a alcançar uma maioria parlamentar, não são suficientes para levarem a cabo as reformas estruturais de que Portugal precisa para resolver os problemas da sua economia.
Por outro lado, foi mau para o próprio Presidente que, no seu «discurso de mandato» (porque terá de valer por cinco anos), se colocou objectivamente ao lado da Direita, ao hostilizar o partido que governa, o qual, apesar de tudo e segundo as últimas sondagens, ainda vale 30% do eleitorado.
Para outras forças políticas mais à esquerda no espectro parlamentar, este foi um discurso que diagnosticou, mas omitiu a cura, um discurso ideologicamente marcado pela chancela de direita.
Assim sendo, Portugal acordou hoje com um novo Presidente, que não é seguramente «o de todos os portugueses» como seria desejável que fosse (meu já era desde que deixou por esclarecer factos importantes que tinha a obrigação de ter esclarecido quando em campanha eleitoral, que é para isso que elas servem ou deveriam servir).
Mas seria injusto neste escrito se não reconhecesse nesse discurso umas quantas verdades que deverão servir a todos os governantes actuais e futuros. Por todas, aqui fica a «dos limites aos sacrifícios que deverão ser pedidos aos portugueses» (não disse quais, mas penso que a todos os portugueses). Ah! também gostei daquela dirigida aos «boys» e que a direita governamentavel aplaudiu. A ver vamos se no futuro não se lhes rebentarão as palmas das mãos...
Deste discurso disse certa imprensa estrangeira que foi um «discurso pessimista», provavelmente mais uma acha para queimar a acção governativa junto dos mercados de capitais. Ou já vale sacrificar tudo aos projectos vindouros, agora que Passos Coelho, finalmente, tem um «manual» para governar fornecido pelo capital e seus gestores ( Cuidado! Os aviões também têm manual e de vez em quando caem)? Quo Vadis Cavaco?

01 março, 2011

31 de Maio de 1212 - 31 de Maio de 2012 - 800 ANOS DO FORAL DE D. SANCHA

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O PRIMEIRO FORAL DE ALENQUER OU DE D. SANCHA
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Para o ano que vem, no dia 31 de Maio, completar-se-ão oitocentos anos sobre a data em que a donatária da vila de Alenquer, a infanta D. Sancha, filha muito querida do nosso rei D. Sancho I, outorgou a esta vila aquela que seria a sua primeira carta de Foral.
Trata-se, portanto, de uma importante efeméride que, com toda a certeza, não passará despercebida à nossa edilidade, particularmente ao nosso pelouro da Cultura. Para quem aqui escreve é, porém, já chegada a altura dela falar, ou melhor, dela ir falando, já que muito de interessante há para dizer a esse propósito, o que assumo com algum atrevimento, uma vez que não sou medievalista.
Antes de mais, será bom dizer, desfazendo equívocos muito comuns, que a Carta de Foral não é um documento libertador, antes pelo contrário, é um documento de sujeição, de sujeição ao Rei, ao Princípe, ao nobre, ao Abade, seja a quem for que a outorga, pois impõe obrigações de vário tipo, principalmente pecuniárias ou fiscais como hoje dizemos. Nos anos da Reconquista, estas cartas dadas às vilas fronteiriças, tinham como principal objectivo atrair e fixar populações, pelo que eram benévolas nas suas imposições.
Todavia, à medida que a Reconquista se foi consolidando, elas tornaram-se mais exigentes, principalmente a partir do reinado de D. Dinis. Seja como for, nada disto obsta a que, bem ou mal, o poder concelhio e as populações olhem hoje para estes documentos como cartas fundadoras da identidade concelhia, marcos importantes do municipalismo português.
Sobre o Foral que a Rainha ( então, filha de Rei era Rainha) D. Sancha deu a Alenquer, existe uma circunstância interessante quanto ao conhecimento que hoje temos deste documento. Na sua obra «Alenquer e seu Concelho» de 1873, Guilherme João Carlos Henriques dá-nos a conhecer o teor desta Carta, mas adverte: «Desse documento que logo transcreveremos, já não existe o original mas há cópia autêntica passada no reinado de D. Dinis e apensa ao foral de Aldeia Galega (da Merceana)».
Portanto, o conhecimento que havia desta Carta de Foral era indirecto, já que a de Aldeia Galega «...era unicamente o foral de Alenquer com duas modificações muito insignificantes». E assim foi, por muito tempo, até ao dia em que...
Damos agora a palavra ao grande estudioso do passado alenquerense, Dr. Luciano Ribeiro, que, em 1936, escreveu em «Alenquer-Subsídios para a sua História»: «Acerca do Foral dado a Alenquer pela sua primeira donatária, a Infanta D. Sancha, em 1212, devemos dizer que até há pouco era desconhecido o original desta documento. Por um feliz acaso, porém, o sr. Dr. Ataíde e Melo, ilustre conservador dos manuscritos da Biblioteca Nacional de Lisboa, encontrou, muito fragmentado o exemplar desta espécie diplomática, infelizmente em muito mau estado visto que estava servindo de capa a um velho livro. É lamentável, porque os seus sete séculos de existência dão a esse enrugado pergaminho o direito à veneração de todos os que se interessam pela História da nossa terra».
Continuaremos...
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Este oitavo centenário, que se celebrará daqui por um ano, leva-nos a pensar como seria interessante a nossa autarquia proceder à edição fac-similada da Carta de Foral acompanhada de estudos que sobre ela incidissem. Igualmente, sendo a vila de Alenquer pobre em obras de arte pública, como ficaria bem um monumento evocativo de D. Sancha, a primeira donatária da vila, e do seu acto de outorga desta Carta de Foral. Que o poder local instituído me desculpe o atrevimento, já que não posso ignorar os apertos financeiros porque passa a nossa Câmara e todas as demais do País.