08 novembro, 2011

A REFORMA ADMINISTRATIVA E AS FREGUESIAS


«...O PRIMEIRO E MAIS SÓLIDO PATAMAR DA DEMOCRACIA PORTUGUESA»
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Em 2006, no jornal local «Nova Verdade», publiquei o artigo acima. Finalmente, decorridos meia dúzia de anos, a reforma das freguesias ganha corpo e sentido. Penso que no momento actual terá algum interesse recordar aqui o que então escrevi.
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O título não é nosso, tomámo-lo de empréstimo a Armando Vieira, presidente da ANAFRE - Associação Nacional de Freguesias, que assim as definiu, concluindo: «...mas continuam a ser o parente paupérrimo da administração pública, vivendo de muita carolice».
Ao todo, por esse País fora, são 4.257, mas o seu peso no Orçamento do Estado é, tão só, de 0,21%! Daqui facilmente se concluirá que, quando se fala da extinção de freguesias, a causa nunca poderá ser económica, ou, pelo menos exclusivamente económica.
Neste universo de mais de quatro milhares de autarquias há de tudo um pouco: Concelhos com uma única freguesia, como, por exemplo, Alpiarça ou Barrancos e concelhos com 89 freguesias como Barcelos. Freguesias com 46 habitantes (2001) como S. Bento de Ana Loura em Extremoz e outras como Algueirão-Mem Martins, Sintra, com 62.557 (2001).
Ainda mais dois exemplos quanto à desproporcionalidade reinante entre freguesias, os quais até poderão não ser dos mais expressivos: Alfândega da Fé, um concelho com 5.796 habitantes, possui 20 freguesias, sendo que duas têm menos de 100 habitantes, dez menos de 200 e seis menos de 500. Arcos de Valdevez regista 51 freguesias, oito com menos de 200 habitantes, 26 com menos de 500 e 12 com menos de 1.000.
Como conjugar esta realidade com uma recente afirmação de Eduardo Cabrita, Secretário de Estado-Adjunto e da Administração Local, o qual numa lógica de proximidade e de serviço público defendeu que «é necessário transformar cada freguesia numa mini-loja do cidadão»? Provavelmente procedendo a uma reforma administrativa (...).
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- Vila Verde dos Francos - A freguesia do concelho mais distante da sua sede, Alenquer.
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Mas, para além do da dimensão ainda subsiste outro problema: o crescimento das urbes, com o surgimento de novas centralidades, tornou sem sentido uma antiga divisão administrativa. Por exemplo, em vez das actuais freguesias de Triana e Santo Estêvão, dividindo ao meio a vila, não faria hoje muito mais sentido a existência de uma freguesia cuja área abrangesse toda a Vila?
Outra questão pertinente, no que às freguesias respeita, é a das competências. Nas freguesias urbanas, com dezenas de milhar de habitantes, a inexistência de competências em áreas consideradas fulcrais como a segurança, a habitação, políticas sociais, etc. são extremamente sentidas. E como entender que uma freguesia, com o seu reduzido orçamento não possa recorrer ao crédito sequer para adquirir uma máquina de que necessita com urgência para tratar dos seus caminhos?
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- ALENQUER - Entre o Tejo e a Serra de Montejunto iam 16 freguesias. Quantas ficarão?
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É ainda necessário que, no futuro, o cumprimento de um mandato numa Junta não seja mais considerado um acto de carolice. Os tempos e os novos desafios aconselham que em cada Junta haja um autarca a tempo inteiro, embora isso só faça sentido num quadro diferente do actual, com freguesias com outra dimensão e novas e mais dilatadas competências.
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 Tanto quanto julgamos saber, o trabalho de adaptação do nosso quadro concelhio de freguesias ao que o «Documento Verde» propõe, está a decorrer sem problemas de maior, com as forças políticas e órgãos autárquicos empenhados na obtenção de um consenso tão amplo quanto possível, mas um consenso que em nada prejudique as populações.
O espírito do documento tem estado presente, mas o quadro que se desenha não virá a ser um quadro a «régua e esquadro», passando por cima de toda a lógica que as realidades locais impõem. Pois que assim seja e que esta venha a ser uma reforma bem aceite, seja qual for o número de freguesias que daí resulte.