26 maio, 2014

EUROPEIAS 2014

NIM EUROPA, NIM PORTUGAL...


 Será que o projecto europeu tal como foi originalmente concebido, ou seja, sem as distorções introduzidas nos últimos anos, particularmente aquelas que a visão política da sr.ª Merkl e apaniguados lhe introduziu, saiu comprometido das eleições ontem disputadas? O soçobrar da social-democracia europeia, corrente política que marcou pela positiva o nascimento e desenvolvimento desse projecto que se queria solidário e humanista, nas águas lamacentas do capitalismo (até Marx já deu sinais de se estar a erguer da tumba) fazia temer o pior. Mas esse "pior" aconteceu ontem?
Nim. É certo que importantes forças anti-europeias, neste ou naquele país, cresceram preocupantemente utilizando como veículo os partidos de extrema-direita, euro-cépticos ou mesmo anti-projecto de uma Europa unida nesta organização que se dá pelo nome de CE. Mas também não é menos certo que os piores cenários não se verificaram. Estamos no pântano, mas (ainda) não submergimos.



 Na noite de ontem, às 22 horas, quando os staffs partidários tomavam posição para enfrentar o que aí vinha, um amigo ao meu lado promonitoriamente sussurrou: «Pronto. Ganharam todos». Nem de propósito, pois pela boca da representante do "Bloco de Esquerda" logo tivemos a confirmação desse aforismo eleitoral: «Conseguimos os nossos objectivos [vitória!], elegemos 1 deputado». Depois foi o costume... Mas, como militante do Partido Socialista, não posso deixar passar em branco (e com mágoa o faço), a desorientação que grassou nas hostes inseguras do António José Seguro, lançando ao vento conclusões absurdas face aos resultados verificados, os quais, sem sombra de dúvida, personificaram a vitória mais desgraçada jamais vivida na casa cor de rosa.
Saída da habitual avalanche de comentadores, a frase que me soou mais ajustada ao momento que se vivia, acabou por ser aquela (do Marcelo Rebelo de Sousa?) que nos colocou perante «uma derrota histórica da AP (PPD/CDS), à qual não correspondeu uma vitória histórica do PS». 
Partidariamente, que mais nos trouxe este acto eleitoral? A vitória do Marinho Pinto que ainda não chegou a Bruxelas e de quem já se fala para as legislativas e para as presidenciais (não sei se ficará por aí ou se terá uma carreira galáctica); uma força anti-europeia, o PCP, que cresceu, um Livre que não "saiu da casca" e um Bloco de Esquerda em dolorosa agonia.
Mas, até agora, só falámos do Portugal que votou, e fazendo-o não tirou do bolso o cartão vermelho, nem tão pouco o amarelo, para o mostrar ao governo. Um nítido "Nim" que deixa tudo na mesma, entenda-se, campo livre ao governo para continuar a sua política anti-popular e anti-nacional. Estou em crer que a anunciada (pelo PCP) moção de censura, tão só lhe vai arranhar o testículo direito, porque quanto ao resto, iremos ter mais do mesmo: mais impostos, mais cortes, mais...


Mas - esse sim é o facto mais relevante - foram às urnas menos de 1/3 dos portugueses e, entre os que o fizeram, ainda há que levar em conta os que votaram em Branco ou Nulo. Podemos entender isso como uma atitude política? Duvido. Estamos perante uma «ruptura democrática», do tipo (ou não) da que Manuel Alegre vaticinou? Ou, como disse o Alberto João, perante um sinal evidente de que o país precisa de um novo regime e de uma nova Constituição (e já agora de um artigo na nova Constituição que inviabilize o aparecimento de novos Albertos Joões)?
Uma última pergunta, esta aos vencedores: Com 31%, 12,7% ou 6 qualquer coisa por cento dos 34% de votos expressos não têm pudor em falar de vitória?

Em Alenquer os resultados foram os do quadro abaixo:










16 maio, 2014

CONVENTO DE S. FRANCISCO, DE ALENQUER


OS CLAUSTROS DO CONVENTO
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- O Convento de S. Francisco fotografado de um ângulo pouco usual (do alto do Ventoso, subindo o ribeiro de S. Benedito). A norte o cemitério, antiga cerca do Convento, terminando no Mazagão ou Barroca. No vale fronteiro, a vila emerge por entre os montes que a comprimem. 

Edificado no mesmo local onde a Rainha D. Sancha, filha de D. Sancho I e donatária da vila, teve o seu paço, o Convento de S. Francisco da vila de Alenquer não passa despercebido a quem visita a vila. Hoje é consensual que terá sido a primeira casa dos franciscanos em Portugal e são de Frei Manuel da Esperança (séc. XVII), primeiro cronista da Ordem, as palavras que transcrevemos e que tão bem nos dão conta da sua localização:
«Pelo que temos escrito se poderá entender a correspondência, que faz este convento à vila. Está fundado junto dela em lugar superior na ladeira de um monte, que, sendo íngreme, neste sítio lhe ofereceu uma planície capaz de seus edifícios. Aqui desta eminência senhorea a mesma vila, recompensando-lhe sua humilde sujeição com uma majestuosa formosura. Participa nos ares muita benevolência do céu, e sem cobiçar cousa alguma da terra, põe os olhos ao perto em uma ribeira fresca, e ao longe vai descobrindo tantas terras aquém, além Tejo, que a vista cansada com estas grandes distâncias não lhes pode dar alcance».
A edificação desta casa por Frei Zacarias e Frei Gualter, discípulos de S. Francisco de Assis, remonta ao já distante ano de 1222, embora os piedosos frades tivessem chegado a Alenquer em 1216, instalando-se primeiro na velha ermida de St.ª Catarina onde construíram «umas celinhas térreas e pobres com algumas oficinas e o coro para louvarem a Deus». 

- Pormenor dos painéis de azulejo que ornamentam a portaria.

Acede-se ao Claustro pela Portaria que se abre no cimo de uma escadaria que tem o seu começo junto ao Pórtico da Igreja (classificado como monumento nacional). Um alpendre recente, porque do original já se perdeu a memória) protege o que resta dos painéis de azulejo do séc. XVIII, o da esquerda historiando  a Aparição dos Santos Mártires de Marrocos à Infanta D. Sancha e o da direita, em melhor estado de conservação, representando o Êxtase do Beato Zacarias perante o Senhor crucificado que lhe falou. Olhando a parte inferior dos painéis veremos paisagens idealizadas ao gosto da época.

- Vista parcial dos Claustros

Poder-se-à dizer que o Claustro é o centro da vida monástica, daí se acedendo a todas as dependências do Convento. No caso presente, o espaço claustral e belo e muito amplo, com trinta e quatro metros de lado. O piso inferior, ou galeria, abre-se em arcos suportados por duas colunatas cujos capitéis estão trabalhados com motivos florais. Nesse piso, por norma situavam-se o refeitório, a cozinha, a casa capitular e outras dependências como a livraria, o lavatório, etc. Nos piso superior, ficavam os dormitórios.
O nosso claustro é manuelino, construído no reinado do nosso Rei D. Manuel, logo sobrevivente ao grande terramoto de 1755 que causou grandes danos no Convento e na Igreja. Prova dessa origem encontramo-la, por exemplo, nos ângulos interiores decorados com elementos característicos da época, como por exemplo a esfera armilar.

- Portal gótico, um dos poucos sinais visíveis da construção original medieva.

Vindos da Portaria, cortando à esquerda e percorrendo essa galeria, encontraremos a porta acima que comunica com o coro, como nos explica Frei Manuel Esperança: «(...) Saindo do coro, e caminhando à mão esquerda pelo claustro para a parte da capelo mor (...) Dobrando daqui a outra quadra do claustro, encontraremos logo a casa do capítulo».
E assim acontece. Mas antes de lá chegarmos ainda encontraremos a porta abaixo representada, hoje fechada e ornamentada com uma pedra de armas...


... assim como «a um canto do claustro inferior, um altar (abaixo) com uma inscrição», ladeado de duas pedras com inscrições.


A inscrição diz o seguinte: «Todos os anos no seu dia tira N. P. S. Francisco seus filhos do purgatório». Já as pedras, uma das quais se mostra abaixo, têm inscrito (a da esquerda): «O devotissimo P.e Frey Cristovão da Conceição celebre por fama de Santidade e milagres passou d'esta vida a 12 de dezembro de 1649 foi achado seu corpo o peito e o coração incorrupto e cheiro suave e trasladado a este logar anno de 1653». Enquanto a da direita tem gravado: «O veneravel Frey António de Xpõ avendo passado quarenta annos de contínua e rigorosa penitencia ornado de muitas e exemplares virtudes acabou seu curso com grande opinião de Santo a 31 de maio de 1636 annos. Foi trasladado á este logar no de 1653».



- Nas galerias claustrais encontraremos várias pedras tumulares. Achámos esta interessante por se referir a um irmão da Ordem do Templo (assim nos parece).

A CASA DO CAPÍTULO

- Portal manuelino da Casa do Capítulo


- Pormenores do portal manuelino da Casa do Capítulo.

- Junto ao portal manuelino vestígios góticos do antigo convento colocados a descoberto quando de umas obras.

Ricamente trabalhado ao estilo manuelino, o portal da Casa do Capítulo apresenta uma «decoração vegetalista onde brincam pássaros, leões e pequenos bambinos». Por curiosidade, diga-se que este convento foi escolhido para aqui se celebrarem nove Capítulos da Ordem Franciscana, nos anos de 1468, 1486, 1545, 1581, 1689, 1702, 1706, 1709 e 1713. Sobre esta casa, situa-se a Capela de Santa Sancha.


Atravessando o jardim interior dos Claustros encontramos este poço que comunica com um gigantesca cisterna que ocupa abaixo do solo (por isso é cisterna...) grande parte do espaço descoberto.

- O Relógio de Sol.

Sobre o canto NO, vislumbraremos outro dos grandes motivos de interesse destes Claustros: o Relógio de Sol oferecido por Damião de Góis, em «mármore fino de Génova» e datado de 1558 (diz-se que teria sido oferecido em 1557, algo não bate certo). 

CAPELA DA FAMÍLIA MIRANDA HENRIQUES

- Capela renascentista da família Miranda Henriques.

- Pormenor do tecto da capela

-Pormenor do arco de entrada da capela.

Quem entrar pela Portaria e seguir em frente pela galeria claustral que se abre perante si, primeiro encontrará uma pequena capela que foi da família Miranda Henriques. O arco de entrada, trabalhado, é interessante pelos seus motivos ditos grotescos e está encimado pela pedra brasonada da família fundadora, assim como pelo que resta de um painel de azulejos.
O tecto é abobadado, apresentando nervuras e florões, bem como um escudete heráldico. Os motivos são renascentistas e os azulejos sobrantes do séc. XVIII.

REFEITÓRIO DOS FRADES

- Refeitório dos frades


- Pormenor exterior do refeitório

De nave única e bem alta e com a parede (a fronteira à entrada) revestida a silhares de azulejo, vendo-se ao centro a escada embebida no muro e o púlpito do leitor, interessante trabalho em pedra, assim se nos mostra o refeitório. Até há bem pouco tempo serviu de arrecadação, mas, quando por lá passámos, preparava-se para receber obras. À esquerda, tem duas janelas (fechadas) que comunicam com a cozinha conventual.

-Porta da cozinha.

-Pormenor do arco superior da porta

A cozinha deverá ser outra dependência interessante desta casa conventual, mas não está acessível, pelo que nos ficaremos por um dos pormenores mais intrigantes da mesma: a sua porta de entrada. Como é bem visível toda ela está construída e trabalhada de forma enviesada. Desconhecemos os motivos e não conhecemos outra semelhante. Um desafio ao saber ou imaginação do visitante.
Aqui, como na arquitectura das casas cistercienses, refeitório e copa encontram-se na ala contrária à igreja.


Terminada a visita olhamos para cima, para o galo que do alto da torre sineira nos espreita. Pensamos que este é todo um conjunto arquitectónico que enobrece a vila de Alenquer e que, sendo propriedade da Misericórdia (e da Paróquia), muito poderá trazer de valioso aos desígnios turísticos da vila.


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A PROPÓSITO:


COLÓQUIO - OS FRANCISCANOS EM ALENQUER

Memórias para a história do primeiro Convento da Ordem em Portugal

AMANHÃ, SÁBADO 17, PELAS 15,30 HORAS
PAÇOS DO CONCELHO DE ALENQUER
COM
PADRE VÍTOR MELÍCIAS E FREI HENRIQUE REMA