26 fevereiro, 2015

AS PONTES QUE ALENQUER TEVE (CONCLUSÃO)


- Fotografia tirada da Variante (sobre a Chemina) vendo-se o antigo campo de futebol do Sporting e, ao fundo deste, a ponte - Retirada da obra "Alenquer Desaparecida" de Filipe Rogeiro.

4) - A PONTE DE SANTA CATARINA

A ponte de Santa Catarina, à entrada da vila, é, porventura, aquela que na biografia alenquerense menos referências colheu. De igual modo, tanto quanto julgamos saber, será aquela que do passado menos imagens nos chegaram. Estamos em crer que, desde sempre, aí existiu uma qualquer passagem sobre o rio, a qual, com o decorrer dos séculos, viria a tornar-se ponte.
Guilherme J. C. Henriques, na sua obra "A Vila de Alenquer", a propósito de Damião de Goes, faz uma referência a uma escritura celebrada por este em 1560 onde consta uma relação «(...) de algumas cousas que mandei e dei a egrejas d'este reino (...)» e, entre elas, diz «fundou outra missa cantada em perpetuo, em dia de Ascenção, para a qual e para fabrica da capella-mór, deixou uma hypotetheca de 10 cruzados annuaes sobre uma horta que possuía á ponte de Santa Catharina». Acreditando aí constar esta referência à ponte, ela será, certamente uma das mais antigas.
Outra referência interessante a esta mesma ponte encontramo-la no livrinho de Albino Figueiredo (que foi administrador deste concelho em meados do século XIX) intitulado "Memória sobre alguns melhoramentos possíveis da vila e do concelho de Alenquer". Aí podemos ler na pág. 28: «Uma pessoa, verdadeira e proba d'esta villa, e que ainda não tem 70 annos, conheceu a ponte de Santa Catharina tão alta que daria passagem a um barco á vella».
A ponte que essa pessoa teria conhecido no início do século, então sobre um rio muito assoreado, seria a que abaixo podemos ver na bonita gravura que iluminou um postal editado por " Fernando Campeão  Saraiva" nos primeiros anos do séc. XX? Temos algumas dúvidas...



Qual terá sido, então, a data de construção desta ponte? Antes de arriscarmos uma data, lembramos que em Portugal as "estradas reais" foram construídas sobre as antigas estradas romanas, e, por sua vez, as estradas nacionais, já pensadas para o trânsito automóvel, seguiram, grosso modo, o traçado das estradas reais.
Dentro desta lógica, somos levados a pensar que esta ponte da antiga EN 1 (estrada hoje desclassificada entre a rotunda do Bravo e a da Boavista) será contemporânea da da "Couraça" à saída do Carregado, construída sobre o rio Grande da Pipa no reinado de D. Maria II (por volta de 1850), quando, efectivamente se conseguiu pôr a funcionar um serviço de correios e diligências entre Lisboa e o Porto.
É certo que no reinado da outra Maria, a primeira, muitas obras públicas foram lançadas e, por curto período, ainda funcionou um serviço de diligências e correio entre Lisboa e Coimbra, o qual, por dificuldades de toda a ordem, viria a ser interrompido. Voltando ao que atrás dissemos, só em meados do século seguinte, em articulação como o comboio que havia chegado ao Carregado se deu início a um serviço regular de diligências para o Porto e também entre o Carregado (estação) e Alenquer, entre muitos outros. Por conseguinte, afigura-se-nos como possível, que a ponte acima seja dessa data.

14 fevereiro, 2015

AS PONTES QUE ALENQUER TEVE




3) - A PONTE DO ESPÍRITO SANTO

A ponte do Espírito Santo é a que liga hoje o largo com o mesmo nome ao Largo Palmira Bastos. A actual ponte é muito recente e sucedeu à que podemos ver no postal abaixo, construída nos anos 40, quando o rio mudou de local dando lugar às Av.ª 25 de Abril (que já foi Av.ª Duarte Pacheco) e à dos Bombeiros Voluntários (primeiro Av.ª Lafaurie e depois Av.ª Dr. Oliveira Salazar).
Olhando esse postal que nos mostra a Fábrica da Chemina intacta, o Parque Vaz Monteiro tal como ficou nos anos 60 quando a alameda de plátanos deu lugar a um jardim e as as avenidas libertas de veículos automóveis, facilmente nos apercebemos como a ponte "estrangulava" o rio contribuindo, desse modo, para a ocorrência de cheias. Daí que, quando das recentes obras de regularização do rio, a mesma tivesse sido demolida para dar lugar à actual.


Mas, antes das duas de que atrás vos falámos, uma outra existiu «muito bem feita e forte» no dizer do Padre Luís Cardoso no seu "Diccionario Geografico" de 1747, pelo que haveria de durar quase quatro séculos, já que foi dada por concluída no dia 28 de Abril de 1571.



Isso mesmo pode ler-se no padrão ainda hoje existente (decorando o jardim do Parque Vaz Monteiro) no qual está inscrito:
«Reinando el-rei D. Sebastião mandou ao concelho desta vila fazer esta ponte em 1571».
A esta inscrição segue-se uma outra que diz «Rainha e Carta // D. Maria». Sobre ela refere Guilherme J. C. Henriques que «No tempo das guerras da Liberdade  os alenquerenses protestaram o seu amor pela Constituição, desfigurando a antiga pedra com as palavras «Rainha e Carta» que mal cabiam no quadrado».



De facto, este bonito padrão que sob as armas reais ostenta as armas da vila, tem tido uma vida errática. Em 1893, no seu n.º 268, dele dava conta o jornal "O Alemquerense", nos seguintes termos:
«Ainda há uns anos se via num dos extremos da ponte, do lado do Largo do Espírito Santo, levantado um padrão onde estavam esculpidas as armas da vila e a data em que a ponte tinha sido feita. Uma câmara qualquer mandou arranjar a ponte e esse padrão foi abandonado; há tempos constou-nos que estava em uma adega de um proprietário desta vila, servindo de cachorro a tonéis».
Em 1902, no "A Vila de Alenquer", Guilherme J. C. Henriques, sobre este mesmo padrão, escreveu:
«Consta-me que quando a ponte foi reparada este padrão foi arrecadado na arcada do Espírito Santo d'onde foi retirado pelo sr. Moysés Carmo, e colocado no sítio que hoje ocupa».


E o lugar que ocupou foi à entrada da ponte, até à demolição da mesma, tal como se pode ver nos postais editados. Ainda no postal acima, ao fundo, abaixo da encosta, os edifícios da desaparecida Fábrica do Meio ou da Companhia, fundada nos últimos anos da primeira metade do século XIX pelo industrial francês Lafaurie.
Da fábrica já não tenho ideia, mas lembro-me bem do edifício à esquerda de quem atravessava a ponte, onde, no piso térreo, funcionava a loja de fazendas e retrosaria do "Santos da Ponte" (Casa Comercial de Serafim A. Santos), assim como dos barracões gémeos da estância do Correia que foram demolidos para a construção do edifício da Caixa Geral de Depósitos.