12 junho, 2010

DIA DE SANTO ANTÓNIO

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O SANTO DA MINHA "DEVOÇÃO"
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Isto dito por alguém que se define como "agnóstico", pode parecer um pouco estranho, pelo que deverá ler-se, isso sim, "santo da minha simpatia". Por assim o ser, a imagem que acima mostro está numa estante, em frente à minha secretária, e por ela nutro grande estima. Para mais, tenho-a como milagrosa. Admiração? Então conto a sua história...
Ela foi-me oferecida por um familiar que me disse: "É muito antiga. Sempre a vi lá por casa e, pelo que sei, foi já dos avós dos meus avós. Como era então hábito, estava em cima de uma cómoda, num singelo oratório de minha bisavó, acompanhada de outras imagens. Só que o marido, bom homem quando estava são, mas de "maus azeites" quando vinha "entornado", nessas noites aziagas tinha por hábito varrer o oratório a vara pau. Muitas imagens assim se partiram, só o Santo António ficava sempre intacto". Milagrosa, digo eu... E aí começou a nascer a minha fézada pelo simpático santo, canonizado por Gregório IX a 30 de Maio de 1232, na catedral de Spoleto, ele que havia falecido no ano anterior, a 13 de Junho.
Depois, certo dia, li estas palavras atribuídas a esse «Doutor Envangélico», como o quis o Papa Pio XII, pela Carta Apostólica «Exulta Lusitanis Fidelis»:
«Fazei o que eles dizem, mas não façais como eles fazem, porque eles dizem, mas não fazem».
Esta sentença nunca mais me saiu da cabeça, e, como não poderia deixar de ser, a minha admiração pelo Santo subiu em flecha.
Para mais este é um Santo popular, que se festeja com sardinha assada, vinho tinto e pratinhos de caracóis. Um Santo casamenteiro, amigo das raparigas que, por imprevidência, quebram as bilhas, coisa que ele, nos termos do milagre, soube remediar na perfeição. Por isso, desculpa lá, oh S. Valentim, mas não fazias cá falta nenhuma, pois para padroeiro dos namorados, o Santo António servia-nos na perfeição!
No concelho de Alenquer, que eu me lembre, o Santo António festeja-se no Camarnal e na Labrugeira, terras onde tem capela, preside a altares e sai em procissão. A propósito, conta-se que em tempos que já lá vão, quando as rivalidades entre terras ainda faziam mortes, houve um marau que quando a procissão percorria as ruas da Labrugeira, declamou bem alto para escândalo e irritação dos fiéis da simpática aldeia:
«Santo António da Labrugeira//parece um lagarto pintado//montado em quatro bestas//nunca o vi tão bem montado». Teve que dar às da vila Diogo, já se vê... Claro que o feito correu por essas terras aqui à volta e era proibido, a bem da saúde, invocar na Labrugeira esta partida.
Publicou o Jornal de Alenquer a partir do seu n.º 192 de 15 de Novembro de 1891, sob o título "Alenquer... n'outros tempos" uma série de interessantes crónicas, assinadas, tão só, por "Um Velho". Uma teve a ver com Santo António, e, por isso, aqui fica:
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Dois Sermões
As irmãs hospitaleiras estabeleceram em Aldeia Gavinha um colégio para a educação de meninas, dando assim aplicação provisória ao legado que lhes deixou o falecido Zacarias, com esquecimento dos seus parentes.
Foi o rev. Padre Raimundo Beirão que organizou a instituição das Irmãs Hospitaleiras. O Padre Raimundo foi, ainda novo, capelão de Aldeia Gavinha. Dotado de uma admirada inteligência, sempre folgazão tocava viola francesa, cantava modinhas e quando em reunião de senhoras era um galanteador;nós por vezes o admirámos, na Quinta de Abrigada, em tempo da exm.ª D. Maria da Piedade, mãe do exm.º sr. Francisco Rafael Gorjão.
Por aquele tempo foi o padre Raimundo convidado para ir ao lugar da Pipa, pregar um sermão da festa de Santo António. No domingo aprazado, apresentou-se, subiu ao púlpito e depois das cerimónias do costume começou a sua arenga do seguinte modo:
«Santo António foi rapaz: eu também fui; Santo António foi galanteador das moças: também eu fui; Santo António partia os cântaros às raparigas: também eu os parti; Santo António cortava os cabelos às moças: também eu fiz o mesmo; Santo António foi frade: também eu o fui»; E seguindo assim as travessuras do santo, advogado das meninas solteiras e tão venerado no Camarnal, ia-as comparando com as suas travessuras de rapaz. Os velhos Brilhas, promotores da festa, bem como os ouvintes, mostravam-se contrariados por o padre Beirão ter sido e feito tudo como foi e fez Santo António.
O padre, continuando diz:...
«-O que porém eu não fui, nem posso ser, foi ser tão santo e virtuoso como Santo António que soube remediar as suas travessuras, praticando verdadeiros e constantes milagres: concertando cântaros, pegando cabelos às raparigas, e, além destes e outros milagres, no intervalo da reza de três Avé-Marias foi a Pádua defender o pai».
Assim continuou a patentear as virtudes e milagres de Santo António, com que os Brilhas e mais festeiros se mostraram satisfeitos.
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Tivemos nesta vila como pároco da extinta freguesia de S. Pedro o padre Francisco Maria d'Almeida Magalhães, por antonomásia o Meio Mundo; este padre foi frade e professor nos Conventos de S. Francisco desta vila e Santo António da Castanheira. Possuía bastante ciência, mas, de maneiras rudes; teve fama de bom pregador sendo por isso convidado para a quase totalidade das festas destes sítios.
Foi convidado o padre Magalhães pelos referidos Brilhas para ir pregar à festa de Santo António. O padre, que não estudava os sermões, subiu ao púlpito parecendo não ter reparado no santo que estava no andor, no corpo da ermida.
Começou pregando as virtudes e milagres de S. Sebastião, repetindo amiudadas vezes o nome do santo. Um dos Brilhas mais influente diz para o padre: - «Não é S. Sebastião, é Santo António que está ali!».
O padre ouvindo a advertência, retorquiu ao Brilha: - «Cala-te bruto que S. Sebastião também foi bom rapaz».
E continuou pregando S. Sebastião pelo que, afinal, se estabeleceram dúvidas se sim ou não deviam pagar ao padre a oração.
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Santo António também foi militar do Exército português. Na imagem acima que se encontra actualmente na capela de N.ª Sr.ª da Vitória, dentro do recinto do Museu do Buçaco e acompanhou o Regimento N.º19 (Cascais), durante a Guerra Peninsular ( Blogue Lagos Militar, consultado para este último apontamento ), o Santo ostenta ao peito a medalha dessa guerra.
De facto Santo António assentou praça em 1668, quando por alvará de 24 de Janeiro, assinado por D. Pedro II, foi alistado como praça no Regimento de Infantaria de Lagos, por tão patriótico serviço prestado, já que a fé dos soldados portugueses atribuía ao Santo, muitos dos êxitos militares alcançados na Guerra da Restauração (1640-1668).
Depois, no dia 12 de Setembro de 1683, D. Afonso VI promoveu Santo António ao posto de Capitão. Neste posto recebia o soldo de 10.000 que lhe foi abonado até 1779, ano em que passou a vencer 15.000 réis, até que o Marquês de Pombal fez que deixassem de o ser, continuando o Santo a servir gratuitamente. No reinado de D. Maria I, o coronel do Regimento de Lagos, requereu, em Janeiro de 1870, que ao seu capitão Santo António fossem pagos os soldos em atraso e ainda, em virtude do o referido capitão, "o mais antigo dos reais exércitos", se achar, de há muito, preterido na promoção, que o mesmo fosse promovido a tenente-coronel. Ainda haveria de chegar a General.