16 fevereiro, 2011

DOM THOMAZ DE NORONHA - O «MARCIAL DE ALENQUER»

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O POETA LIBERTINO E AS FREIRINHAS DE ALENQUER
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Na parte alta da Vila, abaixo da Igreja de S. Francisco e a um extremo do Bairro do Terreirinho, fica o sítio a que os alenquerenses ainda hoje chamam a Cerca. Quem por lá passar perceberá de imediato porquê, pois são bem visíveis alguns panos da grossa muralha que cercava o vetusto Convento.
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-Fotografia do antigo Convento das Clarissas publicada em: - Melo, António de Oliveira e outros; «O Concelho de Alenquer», Vol. 3.

Este Convento de que vos falamos, da Segunda Ordem Franciscana ou das Clarissas, foi fundado pelo alenquerense João Gomes de Carvalho, fidalgo da Casa de D. João III e depois camareiro do cardeal D. Henrique, em meados do séc. XVI. Depois, mereceu as simpatias da Rainha viúva D. Catarina que nele passava temporadas e do Rei D. Sebastião que lhe acrescentou a propriedade da Freiria.
Ao que parece nunca foi uma grande Casa no que diz respeito ao número de religiosas que acolhia. Porém, na sua maioria, eram estas oriundas de famílias ilustres e nobres, filhas segundas da nobreza que por devoção ou viuvez nela se recolhiam sob o hábito franciscano. Com a ocupação francesa da vila, na terceira invasão comandada por Massena, o Convento serviu de quartel, acabando por ser incendiado quando da retirada da força invasora.

Mais tarde, em meados do séc. XIX, foi este propriedade do francês Lafaurie que trouxe para Alenquer a indústria dos lanifícios (fábrica do Meio). Porque Augusto e seu irmão Adrião professavam a religião protestante, logo não podiam ser sepultados em chão sagrado, foi aí que, quando do seu falecimento, ambos foram sepultados em mausoléus construídos após obtida a respectiva licença. Já no séc. XX, com a construção da «cadeia nova» (hoje quartel da GNR) desapareceria parte do edifício conventual e a sua igreja.

Agora que já falámos do Convento, lembremos fugazmente Dom Thomaz de Noronha, nascido em Alenquer, poeta barroco que teria falecido em 1651 e já aqui evocado. Segundo um dicionário de Literatura foi «fidalgo de boa estirpe» e «levou vida algo aventurosa, vindo a dissipar bens e fazenda, morrendo na miséria». Considerado um caricaturista desbocado que não receava desvergonhas e obscenidades, a verdade é que tinha alguma piada. Vejamos:

- «Pergunta de uma linda freira do Convento de Santa Clara de Alenquer, feita a Dom Thomaz e a resposta deste».

Pergunta:

Dizei-me cá uma verdade

Qual é mais do vosso gosto

Estando vós numa grade:

Discrição, ou um bom rosto?

Nota: «grade» - grade conventual que separava as religiosas do mundo profano.

Resposta:

Respondendo a esta questão,

e às coisas do meu gosto

Pede-me a inclinação,

Para a grade, a discrição

E para a cama um bom rosto

-« A uma Freira do mesmo Convento, perguntando ao autor: Quais eram os beijos tristes?»

Resposta:

Se vós algum dia viste

Um homem despido e nu,

E o beijaste no ..ú,

Esses são os beijos tristes.

Pelos vistos não era assim tão triste o recolhimento das freiras Clarissas de Alenquer no séc. XVII, pois ainda lhes sobrava tempo e espaço para estes jogos literários brejeiros...

Aos interessados - Biblioteca Nacional de Lisboa - Mss Fundo Antigo, Vol. 589, fls 13.