O PRIMEIRO FORAL DE ALENQUER OU DE D. SANCHA
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Para o ano que vem, no dia 31 de Maio, completar-se-ão oitocentos anos sobre a data em que a donatária da vila de Alenquer, a infanta D. Sancha, filha muito querida do nosso rei D. Sancho I, outorgou a esta vila aquela que seria a sua primeira carta de Foral.
Trata-se, portanto, de uma importante efeméride que, com toda a certeza, não passará despercebida à nossa edilidade, particularmente ao nosso pelouro da Cultura. Para quem aqui escreve é, porém, já chegada a altura dela falar, ou melhor, dela ir falando, já que muito de interessante há para dizer a esse propósito, o que assumo com algum atrevimento, uma vez que não sou medievalista.
Antes de mais, será bom dizer, desfazendo equívocos muito comuns, que a Carta de Foral não é um documento libertador, antes pelo contrário, é um documento de sujeição, de sujeição ao Rei, ao Princípe, ao nobre, ao Abade, seja a quem for que a outorga, pois impõe obrigações de vário tipo, principalmente pecuniárias ou fiscais como hoje dizemos. Nos anos da Reconquista, estas cartas dadas às vilas fronteiriças, tinham como principal objectivo atrair e fixar populações, pelo que eram benévolas nas suas imposições.
Todavia, à medida que a Reconquista se foi consolidando, elas tornaram-se mais exigentes, principalmente a partir do reinado de D. Dinis. Seja como for, nada disto obsta a que, bem ou mal, o poder concelhio e as populações olhem hoje para estes documentos como cartas fundadoras da identidade concelhia, marcos importantes do municipalismo português.
Sobre o Foral que a Rainha ( então, filha de Rei era Rainha) D. Sancha deu a Alenquer, existe uma circunstância interessante quanto ao conhecimento que hoje temos deste documento. Na sua obra «Alenquer e seu Concelho» de 1873, Guilherme João Carlos Henriques dá-nos a conhecer o teor desta Carta, mas adverte: «Desse documento que logo transcreveremos, já não existe o original mas há cópia autêntica passada no reinado de D. Dinis e apensa ao foral de Aldeia Galega (da Merceana)».
Portanto, o conhecimento que havia desta Carta de Foral era indirecto, já que a de Aldeia Galega «...era unicamente o foral de Alenquer com duas modificações muito insignificantes». E assim foi, por muito tempo, até ao dia em que...
Damos agora a palavra ao grande estudioso do passado alenquerense, Dr. Luciano Ribeiro, que, em 1936, escreveu em «Alenquer-Subsídios para a sua História»: «Acerca do Foral dado a Alenquer pela sua primeira donatária, a Infanta D. Sancha, em 1212, devemos dizer que até há pouco era desconhecido o original desta documento. Por um feliz acaso, porém, o sr. Dr. Ataíde e Melo, ilustre conservador dos manuscritos da Biblioteca Nacional de Lisboa, encontrou, muito fragmentado o exemplar desta espécie diplomática, infelizmente em muito mau estado visto que estava servindo de capa a um velho livro. É lamentável, porque os seus sete séculos de existência dão a esse enrugado pergaminho o direito à veneração de todos os que se interessam pela História da nossa terra».
Continuaremos...
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Este oitavo centenário, que se celebrará daqui por um ano, leva-nos a pensar como seria interessante a nossa autarquia proceder à edição fac-similada da Carta de Foral acompanhada de estudos que sobre ela incidissem. Igualmente, sendo a vila de Alenquer pobre em obras de arte pública, como ficaria bem um monumento evocativo de D. Sancha, a primeira donatária da vila, e do seu acto de outorga desta Carta de Foral. Que o poder local instituído me desculpe o atrevimento, já que não posso ignorar os apertos financeiros porque passa a nossa Câmara e todas as demais do País.